As Elegias de Duíno #2

de Rainer Maria Rilke

Publicado em 24 de Janeiro de 2017

 

Quem, se eu gritasse, entre as legiões dos Anjos me ouviria?

E mesmo que um deles me tomasse inesperadamente em seu coração,

aniquilar-me-ia sua existência demasiadamente forte.

Pois que é o Belo senão o grau Terrível

que ainda suportamos e que admiramos

porque, impassível, desdenha destruir-nos?

Todo Anjo é terrível.

E eu me contenho, pois, e reprimo o apelo

do meu soluço obscuro.

Ai, quem nos poderia valer?

Nem Anjos, nem homens

e o intuitivo animal logo adverte

que para nós não há amparo neste mundo definido.

Rasta-nos, quem sabe, a árvore de alguma colina,

que podemos rever cada dia;

resta-nos a rua de ontem

e o apego cotidiano de algum hábito

que se afeiçoou a nós e permaneceu.

E a noite, a noite, quando o vento pleno dos espaços

do mundo desgasta-nos a face — a quem furtaria ela,

a desejada, ternamente enganosa, sobressalto

para o coração solitário?

Será mais leve para os que se amam?

Ai, apenas ocultam eles, um ao outro, seu destino.

Não o sabias?

Arroja o vácuo aprisionado em teus braços

para os espaços que respiramos — talvez pássaros

sentirão o ar mais dilatado, num voo mais comovido.

Sim, as primaveras precisam de ti.

Muitas estrelas queriam ser percebidas.

Do passado profundo afluía uma vaga,

ou quando passavas sob uma janela aberta,

uma viola d’amore se abandonava.

Tudo isso era missão.

Acaso a cumpriste? Não estavas sempre distraído,

à espera, como se tudo anunciasse a amada?

(Onde queres abrigá-la, se grandes e estranhos pensamentos vão e vem dentro de ti e, muitas vezes, se demoram nas noites?)

Se a nostalgia vier, porém, canta as amantes;

ainda não é bastante imortal sua celebrada ternura.

Retoma infinitamente o inesgotável louvor.

Rainer Maria Rilke

 

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Fontes e Referências

As Elegias de Duíno – Rainer Maria Rilke

 

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