Mnemosine e as Musas

Conhecendo as nove filhas da deusa da Memória e do Esquecimento que sabiam mentir e revelar a verdade

Publicado em 28 de Fevereiro de 2016

 

Texto original Lucia de Belo Horizonte

Mnemosine — a deusa de memória, era filha de Géia e Urano. Tendo se unido a Zeus gerou nove filhas: as Musas. Hesíodo pastoreava seus rebanhos no Hélicon quando as Musas se dirigiram a ele e lhe disseram que sabiam mentir e revelar a verdade. Deram-lhe um ramo de loureiro e iniciaram-no como poeta. Em vista disso, ele contou-nos as origens ancestrais dos deuses.

O esquecimento das tristezas e cessação dos cuidados eram governados pela personificação de Lethe ou Lesmosyne — a deusa do esquecimento. Como um rio, faz parte do Mundo Subterrâneo que era denominado “campos leteus ou a casa de Lethe”, porque na região infernal havia também uma fonte de Mnemósine.

Longe de outros deuses Mnemosine deu a luz às suas filhas, as Musas que moravam com as Graças e Hímero, o duplo de Eros. Elas seguiam os caminhos do Olimpo entoando um canto imortal. Seus hinos ecoavam pela terra e lindo era o som dos seus passos. Tinham também um local de dança no cume do Hélicon e do altar de Zeus. Todas as vezes que se dirigiam ao Olimpo iam envoltas em nuvens, quando só se podia ouvir as suas vozesmaravilhosamente belas na noite.

As Musas sempre foram descritas pelos poetas como fonte de inspiração e diziam serem em quantidade muito maior. Da boca das pessoas que elas amavam fluíam a fala meiga e o doce canto. Elas também eram chamadas de Mnéias, plural de Mnemósine. Supunha-se que elas haviam sido chamadas: Mélete, “a que pratica”; Mneme,”a que recorda”; e Aede, “a que canta”.

  • Calíope — Musa da Eloquência
  • Clio ou Kleio — Musa da História
  • Erato — Musa da Poesia romântica
  • Euterpe — Musa da Música
  • Melpômene — Musa da tragédia e alegria
  • Polimnia — Musa da poesia lírica
  • Terpsícore — Musa da dança
  • Talia — Musa da comédia
  • Urânia — Musa da astronomia e da astrologia

Afirmavam os poetas que tudo que diziam era apenas repetição do que as Musas lhes haviam dito e davam a elas todo o crédito. Eles invocavam sua Musa e esperavam que ela viessem atendê-los na sua inspiração. Quando as Musas cantavam, tudo se imobilizava: o céu, as estrelas, o mar e os rios. Podiam assumir a forma de pássaros e se achavam muito próximas das ninfas das fontes, exatamente como sua mãe Mnemósina que era associada às nascentes, tanto no mundo subterrâneo quanto no mundo superior.

Calíope — Musa da Eloquência

Seu nome tem o significado de rosto formoso. Era a mais velha, mais sábia e distinta das nove musas. Tinha uma linda voz e foi a mãe das sereias, dos coribantes, de Orfeu e Linus com Apolo.

Atuou como mediadora na disputa de Adônis entre Perséfone e Afrodite. Representada sob a figura de uma donzela de ar majestoso, coroada de louros e armada de grinaldas, aparece sentada em atitude de meditação e um livro tendo, junto de si, mais três livros: a Ilíada, a Odisseia e a Eneida. Seus símbolos são um pergaminho, a tábua de escrever e um estilete.

Clio ou Kleio — Musa da História

Seu nome tem o significado “Proclamadora. Com Pierus rei da Macedônia, foi a mãe de Jacinto. A ela é atribuída a introdução do alfabeto fenício na Grécia.

Era a que divulgava e celebrava realizações, a que dá fama. Seus símbolos usuais são um rolo de pergaminho ou um conjunto de tábuas para a escrita.

Erato — Musa da poesia amorosa e romântica

Seu nome tem o significado “Adorável”, a amável, que desperta o desejo. A Musa da poesia lírica, particularmente a poesia amorosa ou erótica, e da mímica. Ela é representada usualmente com uma lira ou com uma coroa de rosas. Teve com Arcas o filho Azan.

Euterpe — Musa da História

Seu nome tem o significado “Delícia, plena alegria”. Pela cultura grega, é uma das nove musas de Apolo. Além da Música, é a Musa da alegria e do prazer e do tocar de flauta. A ela atribui-se a invenção da flauta dupla, que é o seu símbolo. No final do período clássico foi nomeada a musa da poesia lírica e usava uma flauta. Alguns consideram que tenha inventado aulos ou flauta-dupla, mas a maioria dos mitólogos dão crédito a Marsyas.

Melpômene — Musa da tragédia e da alegria

Seu nome tem o significado de “Coro”, a que canta. A Musa da tragédia é usualmente representada com uma máscara trágica e usando os coturnos — botas tradicionalmente gastas e usadas pelos atores. Algumas vezes ela segura uma faca ou bastão em uma mão, e a máscara na outra, e uma coroa de ciprestes.

Polímnia — Musa da poesia lírica

Seu nome tem o significado de “muitas canções e da narração de histórias”. É a Musa grega do hino sagrado, da eloquência e da dança, representada usualmente numa posição pensativa ou meditativa.

Ela é uma mulher de olhar sério, vestindo num longo manto. Algumas vezes pensativa tem um dedo na boca, também era considerada a Musa da geometria, meditação e agricultura.

Terpsícore — Musa da dança

Seu nome tem o significado “Delícia de dançar”, a radiante ou rodopiante. Seu símbolo é a lira. De acordo com algumas tradições, ela é a mãe da sereias junto com o deus ribeirinho Aquelau.

Talia — Musa da Comédia

Seu nome tem o significado “Festividade”. É a Musa grega que preside a comédia e a poesia leve, a que floresce e festiva.

Seus símbolos são a máscara cômica e um cajado de pastor. Talia também é o nome de uma das Graças ou Cárites.

Urânia — Musa da Astronomia e Astrologia

Seu nome tem o significado “Rainha das montanhas”, a celestial. Musa grega da astronomia e da astrologia, é representada com um globo na mão esquerda e um prendedor na direita. Urânia veste-se com um manto bordado com estrelas e ela mantém seus olhos fixos no céu.

Mnemosine era a divindade que mantinha vivos os fatos frente aos perigos da infinitude e aos perigos do esquecimento que na cosmogonia grega aparece como um rio, o Lete, um rio a cruzar a morada dos mortos que provocava letal esquecimento. No Tártaro, era de onde as almas bebiam sua água quando estavam prestes a se reencarnarem e, por isso, esqueciam sua existência anterior.

A mnemónica, que partilha a etimologia de Mnemosine, é usada como auxiliar de memória, para memorizar listas e fórmulas, baseadas em formas simples de memorização, dentro do princípio de que a mente humana tem mais facilidade de memorizar dados quando estes são associados a informação pessoal, espacial ou de caráter relativamente importante, com significado aparente, pois sequências sem algum sentido são igualmente difíceis de memorizar.

Também pertence à mesma família etimológica pertence a palavra Música — que concerne às Musas e Museu — o templo das Musas, onde elas residem ou onde alguém se aperfeiçoa nas diversas artes.

Era através da audição do canto que o homem comum podia romper os estreitos limites de suas possibilidades físicas de movimento e visão, transcender suas fronteiras geográficas e temporais, entrar em contato e contemplar figuras, fatos e mundos que pelo poder do canto se tornavam audíveis, visíveis e presentes. O poeta, portanto, tem na palavra cantada o poder de ultrapassar e superar todos os bloqueios e distâncias espaciais e temporais, um poder que lhe é conferido pela Memória ou Mnemosine, através das palavras cantadas das Musas.

O dom de Mnemósine é conduzir o côro das Musas e, confundindo-se com elas, presidir a função poética. A Grécia arcaica da mesma forma que diviniza a função psicológica da memória e diviniza a possibilidade de suas funções. A poesia é uma espécie de possessão pelas Musas, de delírio divino que toma o poeta e o transforma no intérprete de Mnemósine, daquela que tudo sabe.

Conhecer os mitos é aprender o segredo da origem das coisas. Aprende-se não só como as coisas passaram a existir, mas também onde as encontrar e como fazê-las ressurgir quando elas desaparecem. No contexto mítico, recordar significa resgatar um momento originário e torná-lo eterno. A recordação, como resgate do tempo, confere imortalidade àquilo que ordinariamente estaria perdido de modo irrecuperável. Traz de novo a presença dos Deuses, os feitos exemplares que forjam os heróis e que perseguimos ainda hoje como modelos exemplares. Nos coloca novamente em presença das tradições dos antepassados que nos tornaram o que somos.

O papel da memória não é apenas o de simples reconhecimento de conteúdos passados, mas um efetivo reviver que leva em si todo ou parte deste passado. É o de fazer aparecer novamente as coisas depois que desaparecem. É graças à faculdade de recordar que, de algum modo, escapamos da morte. O esquecimento é a impermanência, a mortalidade. Conforme Platão: a natureza mortal procura, na medida do possível, ser e ficar imortal.

O lugar da memória é o lugar da imortalidade, que guarda a glória imortal das obras produzidas e deixadas para as gerações. São os filhos uma espécie de memória que se perpetua pelo sangue ou pelos genes. São os valores e as culturas, que permanecem como expressão máxima do pensamento e do sentimento humano.

A memória não está apenas no passado, mas está presente em nossos corpos, em nosso idioma, no que valorizamos, no que aprendemos, tememos e no que esperamos. A memória liga o presente ao passado, mostra a diferença e aponta a repetição, permitindo que possamos admirar o que é novo. Porque só é novo aquilo que procuramos referências na memória e não encontramos, pois no instante seguinte em que percebemos algo novo, ele já pertence ao passado e ao domínio da memória.

Não nos lembramos de tudo, lembramos aquilo que tem significado, aquilo que é importante. Assim, vivemos entre a memória e o esquecimento, talvez porque vivamos entre o ser e o não ser mais. Certamente precisamos de ambos para viver. A memória nos faz lembrar de quem somos e é o que nos faz querer ir a algum lugar.

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