Os animais no Tarô #1: Os cavalos

O que significam os cavalos brancos, pretos e vermelhos no tarô?

Publicado em 10 de Julho de 2019

 

Mais uma vez, os bichos se alegram por ajudar os homens, ainda que, infelizmente, nem sempre estes saibam compreendê-los.

Algum tempo atrás, eu escrevi um texto chamado “O simbolismo dos animais no Tarô e no ocultismo” com uma abordagem resumida sobre os principais animais que temos recorrentes nos símbolos do ocultismo e nas artes esotéricas. Nessa nova série vamos nos aprofundar no assunto, analisando as principais ocorrências dentro do tarô. Hoje vamos falar sobre os cavalos.

 

O símbolo do cavalo

Antes de entrarmos no tarô em si, vamos analisar o símbolo geral do cavalo, que é tão significativo que poderíamos até mesmo considerá-lo um arquétipo. É comum a representação do cavalo porque ele simboliza uma força ou energia selvagem muito poderosa e resistente e que ao mesmo tempo pode ser domada. O cavalo pode ser usado para transporte de carga, chegar em algum lugar, corrida, e até mesmo como um instrumento militar.

Alguns testes psicológicos colocam a imagem do cavalo como uma forma geral de se imaginar o subconsciente da pessoa se relacionando com pessoas próximas como parceiros amorosos ou familiares do ambiente do lar. Exemplo: “imagine que você está em um campo, e nesse campo existe um cavalo. Como esse cavalo aparece na sua imaginação? Está livre e solto? Ou está com rédeas preso junto a você?”. Se a pessoa responde que o cavalo está solto como um cavalo selvagem, provavelmente ela mantém relacionamentos mais livres com as pessoas sem tantos compromissos e cobranças. Agora se a pessoa imagina um cavalo com rédeas, demonstra o contrário, relacionamentos mais rígidos, com regras e limites muito bem estabelecidos.

Esse último exemplo é um resumo bem superficial sobre o teste completo em si, mas aqui o objetivo é apenas comentar sobre o assunto. Pessoas que sonham com cavalos ou têm essa identificação com tal animal, normalmente, é justamente pela identificação da força e várias utilidades que esse impulso selvagem pode ser empregado, seja com algum controle (as rédeas) ou até mesmo, a dificuldade de conseguir domar esse ser, como subconscientemente significar uma vontade de potência tão grande que é reprimida pela pessoa, que ela não consegue nem mais domá-la.

O signo de Sagitário é representado por um centauro (metade cavalo metade homem), uma analogia à força selvagem do cavalo, mas que é direcionada pela inteligência focada e determinada da razão (o homem), e talvez em sua sombra, o homem que, apesar de seu objetivo, acaba sendo levado pelos caprichos dessa força selvagem sem controle.

 

O cavalo tem uma posição de nobreza também, mesmo nas sociedades antigas, tendo domado outros animais de força que permitisse a montaria (touros e elefantes por exemplo), o cavalo sempre teve um lugar de destaque, não só pela beleza do animal, mas pela sua resistência, facilidade de adaptação, alimentação e procriação, afinal, para criar um cavalo não seriam necessários grandes meios para mantê-lo alimentado, ou seja, um ótimo custo benefício.

Outro fator que colaborou para termos esse símbolo tão forte e presente na nossa cultura e subconsciente é que os cavalos foram um dos primeiros animais que o homem domesticou há cerca de 6 mil anos:

Os cavalos foram domesticados por humanos pela primeira vez há cerca de 6 mil anos em campos na Ucrânia, sudoeste da Rússia e oeste do Cazaquistão. A partir de então, cavalos domésticos espalharam-se pela Europa e Ásia, reproduzindo-se com éguas selvagens no processo. Além da montaria, também eram fonte de carne e leite.

 

O Cavalo Selvagem

 

O selvagem garanhão branco do filme francês Crin Blanc (1953).

Cavalos selvagens simbolizam, inúmeras vezes, impulsos instintivos incontroláveis que podem emergir do inconsciente — e que muitas pessoas tentam reprimir. No filme, o cavalo e o menino estabelecem um estreito relacionamento (apesar de o cavalo ter a vida selvagem de sua manada). Mas vários cavaleiros partem para capturar os cavalos selvagens. O garanhão e o menino que o monta são perseguidos durante muitos quilômetros; por fim veem-se encurralados numa praia. Para não serem capturados, ambos mergulham no mar e são arrastados pelas águas. Simbolicamente, o final da história parece representar uma fuga para o inconsciente (o mar) como meio de escapar da realidade do mundo exterior.

O psicologo Carl G. Jung, que marcou a história da psicologia com seus estudos sobre o inconsciente e a interpretação de sonhos, nos deu um belo relato sobre como o simbolismo do cavalo está ligado com elementos da nossa psique e a realização da nossa personalidade:

Um senhor de idade muito regrado e disciplinado, vivia uma vida reclusa como de ele para ele mesmo. Devido a tamanho pragmatismo em suas regras e costumes. Ele teve o seguinte sonho:

Eu morava em uma casa muito grande, com vários quartos e corredores, que levavam a portas e salas a qual nunca tinha visto. O que me era estranho, era o fato de nenhuma dessas portas terem fechaduras ou trancas, qualquer um poderia entrar facilmente. Continuei minha investigação e acabei parando em um jardim muito bonito, com portões para várias ruas diferentes. Logo passaram por mim no gramado três belos cavalos. Eram animais fortes, bonitos e fogosos. Mas, não traziam cavaleiros, teriam fugido de uma tropa do exército?

O fato do sonhador julgar que os cavalos teriam evadido de uma tropa militar (o auge de uma doutrina disciplinar), mostra um impulso do inconsciente em ser livre para explorar todo um potencial natural de descobertas e aventuras, mas que é subjugado sobre um julgamento de regras e doutrinas rígidas, o impedindo para sempre de uma integração total com o meio natural. Percebam que o sonhador reconhece a força e o potencial que o cavalo pode ter, desde que estejam debaixo de uma regra de disciplina. Mas o próprio estado saudável dos animais, mostra que eles podem ser o máximo do que podem, sem qualquer rigidez ou “algo” para dizer o que devem ou não.

 

Sem mais delongas, vamos analisar os cavalos presentes no Tarô de Rider Waite:

Para esse texto, vou analisar apenas cartas do tarô clássico de Rider Waite, primeiro, por ser o tarô mais comum e segundo, porque é o que tem as melhores referências e variações de cores entre os cavalos e contendo um significado específico sobre isso. Digo isso, porque se olharmos o tarô de Marselha, por exemplo, com exceção da carta do Carro, todos os demais cavalos têm a mesma cor, que não dá para sabermos se são intencionalmente brancos, ou se só são brancos por causa das limitações de cores dentro de cada carta.

Outra questão sobre o Tarô de Rider Waite que precisa ser observada aqui, é que algumas das referências que vamos usar são baseadas em ideias cristãs, em especial ao do livro do Apocalipse. Isso porque Waite era inglês, a ilustradora do Tarô (Pamela Smith) também era, e dentro da sociedade inglesa do começo do século XX, elementos cristãos estavam inseridos em toda parte, não só entre aqueles que professavam tal fé, mas em elementos corriqueiros das pessoas e na cultura rica da Inglaterra, como a literária com Shakespeare, e a própria coroa real do Reino Unido.

 

O Cavalo Branco

Sem dúvida, esse é o cavalo mais presente no tarô de Rider Waite, aparecendo tanto nos Arcanos Maiores como nos Arcanos Menores.

Esse será um dos únicos casos onde o cavalo não terá relação com o Apocalipse, como veremos nos cavalos de outras cores.

O Cavalo Branco aqui simboliza uma elevação espiritual, ou seja, a força empregada pelo personagem da carta, ou questão sendo analisada, é feita, realizada ou pelo menos disponibilizada por um propósito nobre, uma causa ou crescimento espiritual ou movida por uma energia que não é humana carnal, e sim pura, limpa:

 

Na carta da Morte por exemplo, temos a primeira ocorrência do Cavalo Branco no deck. Aqui a morte cavalga sem pressa, cumprindo o seu propósito. A ideia aqui é que a força de ação da morte é feita inevitavelmente, porque todo ciclo iniciado, precisa de um fim, e esse fim não é simplesmente pois a “morte é má” e sim porque é um propósito eterno, um ciclo eterno que toda a realidade física está sujeita.

 

Na carta do Sol, temos novamente o Cavalo branco, mas aqui ele está sem rédeas e uma criança montada nele. Na carta do Sol é uma energia incrível que está disponível para a ação, para a vida, para a realização, e tudo é divertido e belo com o olhar alegre de uma criança, que também representa fertilidade, novos começos. Se tivéssemos apenas a criança aqui, traria uma mensagem muito de limitação, afinal, qual é a força e resistência de uma criança? Agora uma criança montada na força selvagem de um cavalo, a inocência e possibilidade de criar, de realizar com o potencial da fera selvagem que também é livre, já que não tem rédeas. E esse processo, essa possibilidade é pura e verdadeira, já que como o cavalo é branco, mostra a pureza da situação da cena retratada.

 

No naipe de Copas temos novamente o Cavalo Branco, com uma postura semelhante ao cavalo que é mostrado na carta da Morte, uma postura que parece que ele está trotando, não totalmente parada, mas também sem desenvolver velocidade. A carta do cavaleiro de copas é uma carta de devoção pelos sentimentos, pelas emoções, pela pessoa ou algo amado. Tem uma mensagem de “cuidado por algo” muito forte. Li uma vez, que esse movimento cuidadoso do cavalo é para que o cavaleiro não derrube se quer uma gota do conteúdo da taça, como se fosse um sentido de preservação do propósito. Aqui notamos que esse cavaleiro em seu elmo tem asas, acredito que foi uma adaptação da ilustradora do tarô Rider Waite, Pamela Smith na tentativa de representar o cavalo sagrado da mitologia grega Pegasus, que geralmente quando é retratado em algum mito está participando das aventuras de um homem apaixonado indo ao resgate de sua amada (como vimos no mito do Resgate de Andrômeda).

 

 

Na carta do 6 de Paus temos novamente o cavalo branco na entrada triunfal do vencedor: o personagem ao centro está retornando para o lar, depois de conseguir uma importante vitória ou conquista, e ao chegar, é recebido com festa e louros pelo feito. O cavalo branco aqui mostra que foi uma conquista com um teor nobre ou puro, e percebam que além das rédeas, o cavalo também está bem adornado com capas e outros enfeites, bastante semelhante aos “triunfos” na Europa, que eram desfiles que certos membros da nobreza realizavam pelas ruas após conseguirem alguma vitória ou conquista.

 

O Triunfo da Morte de Petrarca. Uma alegoria sobre os desfiles de Triunfo da idade média.

 

Já no cavaleiro de Espadas, o nosso cavalo branco agora em velocidade, usado como meio militar do nosso cavaleiro. Essa carta representa o uso das forças mentais ou dos planos das ideias em algo, “atacar um pensamento”, ir ao ataque com força e velocidade. Sua ação é mentalmente dirigida, ele traça um plano de ação e o realiza custe o que custar! É um batalhador, decidido, e firmemente determinado, mas um tanto obsessivo com suas metas. E não à toa ele é branco: Agressividade bem dirigida é uma ótima ferramenta de ação.

 

O Cavalo Preto

Só aparece uma única vez em todo Tarô de Rider Waite, está presente no Cavaleiro de Ouros:

 

Pela representação da carta, não poderia ser um cavalo de cor diferente. O Cavalo Preto representa fome, a falta, o desejo por algo, e essa representação é influenciada pelo cavaleiro de mesma cor do Apocalipse:

“EIS um cavalo preto; e o que estava sentado nele tinha uma balança na mão. E eu ouvi uma voz como que no meio das quatro criaturas viventes dizer: ‘Um litro de trigo por um cenário, e três litros de cevada por um denário; e não faças dano ao azeite de oliveira e ao vinho.’” — Apocalipse 6:5, 6.

O naipe de ouros representa a esfera humana das posses, saúde, dinheiro, trabalho etc. E é do elemento terra. Essa carta representa o trabalho que é alcançado por esforço, determinação, o cumprimento de metas, mesmo que elas sejam fatigantes ou desafiadoras no sentido de complicadas ou com obstáculos. A ideia de “O Cavalo da Fome” não significa que quando esse cavalo estiver presente a mensagem é de “terá fome ou falta” e sim que quem tem fome, busca ser saciado, e a fome é um dos instintos mais comuns entre os seres vivos, algo que não pode ser evitado ou adiado, quando ela vem, geralmente buscamos imediatamente saciá-la.

Algumas literaturas colocam o cavalo preto como um convite à uma análise interior sobre os desejos, o que de certa forma pode fazer sentido, já que quando sentimos falta de algo, não adianta sairmos desesperadamente à saciedade, sem primeiro, termos certeza exata do que realmente estamos querendo.

 

O Cavalo Vermelho

 

Algumas pessoas questionam se na verdade esse cavalo não seria marrom, mas não faria sentido, já que a crina dele é vermelha como os adornos da roupa do cavaleiro, e o naipe de Paus é do elemento fogo, o que justificaria o vermelho na tonalidade e não marrom.

Essa carta representa a força de vontade, a exibição da força, da forma e do que se sabe fazer: Avança de modo decidido e impetuoso, e às vezes impaciente, na direção do seu objetivo, quase de forma exibicionista, arrasadora, sem deixar nada passar, afinal, o que pode escapar após cair dentro de uma chama ardente?

“Então saiu outro cavalo, vermelho. Ao seu cavaleiro foi dado tirar a paz da terra para que os homens se matassem uns aos outros. Também lhe foi dada uma grande espada.” Apocalipse 6:4

A questão de “tirar a paz da terra”, a meu ver, vem da situação onde ao impor a nossa vontade no mundo, inevitavelmente vamos entrar em choque com a vontade e determinação de outros, e esse cavaleiro é tão impetuoso que dificilmente irá ceder, querer menos que a vitória ou uma “vitória menor”, apenas ganhar é opção, a conquista total, e muitas vezes um impulso descontrolado e violento.

Algumas pessoas podem considerar a postura desse cavaleiro “negativa”, mas como veremos em mais textos dessa série sobre os animais no tarô, eles são um convite para sermos fortes e hábeis e não fracos e mansos.

 

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Fontes e Referências

Obrigado Ingrid Pereira e Val Felix pela revisão do texto.

 

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